A imprensa musical, como as outras aliás, gosta de fabricar ondas. A onda agora é a da Lisboa multicultural, creoulizada. Até certo ponto, ou até mesmo em larga medida, o hype é justificado. Tem saído da capital grande música nos últimos anos. Sons que não ficam a dever nada a ninguém em imaginação e verdade; nas referências cruzadas que podem ir desde o funana e o kuduro até ao free jazz ou o Vítor Espadinha.
O problema é que se sente de modo demasiado evidente a diferença entre os produtores culturais que de facto vivem na tal Lisboa creoula e que circulam com igual à vontade em Chelas ou na Lapa, no gueto ou na academia e os que a tentam divulgar e explicar a sua arte às massas, muitos deles educados em velhas lógicas, ainda não ultrapassadas.
Vem esta conversa a propósito do artigo que o Y de hoje dedica ao Sam the Kid. Ao contrário do que sucedeu com outros artistas da mesma onda, neste caso a jornalista teve que se deslocar a Chelas e o desconforto, ou pelo menos a relação exótica que mantém com o contexto em causa é evidente. Não apenas com o contexto geográfico e arquitectónico, visível nos comentários mais ou menos abundantes sobre as torres e os comboios e outros marcos simbólicos do subúrbio, mas na própria forma como se coloca na pele da tradutora de um mundo socialmente distante, numa tentativa de tentar perceber como pode dali sair qualquer tipo de forma de arte valorizável. Tipo
um boi a olhar para um palácioMas se calhar é só uma paranóia de classe minha...